O Minha Casa Minha Vida é um dos maiores programas sociais do país. O Governo Federal quer construir 2 milhões de moradias até 2026. Só em 2023, o orçamento será de R$ 9,5 bilhões. Arquitetos e urbanistas apresentaram suas propostas para melhorar a qualidade dessas habitações em audiência pública realizada no Senado Federal. Participaram senadores, deputados, associações de prefeitos e da construção civil, além representantes do Ministério das Cidades, da Prefeitura de São Paulo e da Caixa Econômica Federal.
A presidente do CAU Brasil, Nadia Somekh, defendeu que o Minha Casa Minha Vida não pode focar apenas em construções novas. “Estamos tratando de melhorar 25 milhões de moradias, quase 100 milhões de pessoas, com problemas de infraestrutura em casa”, afirmou. Na Comissão Mista do Congresso Nacional que estuda mudanças na Medida Provisória (MP) 1.162/2023, Nadia falou ao presidente da Comissão, senador Eduardo Braga (MDB-AM), e ao relator, Fernando Marangoni (União-SP), sobre a real dimensão dos problemas habitacionais que o Brasil enfrenta:
- Cerca de 25 milhões de domicílios com problemas de cobertura, piso, falta de banheiro, sem regularização.
- 60% dessas habitações são chefiadas por mulheres.
- 82% das edificações são feitas sem arquitetos e engenheiros, o que resulta em problemas na saúde e segurança dos moradores.
“Arquitetas e arquitetos podem contribuir para efetivação do direito à melhoria da moradia desde 2008, quando foi promulgada a Lei de Assessoria Técnica em Habitação de Interesse Social”, afirmou. Para resolver esses problemas, a presidente do CAU Brasil defendeu que a Lei de ATHIS seja incluída no Programa Minha Casa Minha Vida.
O deputado Marangoni, relator da MP 1162/23, concordou. Ele anunciou que deve incluir em seu parecer medidas para garantir a melhoria de moradias existentes. “O déficit qualitativo é três vezes maior do que o déficit quantitativo. Não tem como a gente hoje não contemplar no texto da medida provisória as melhorias habitacionais. Seria fechar o olho talvez para o problema mais grave que temos hoje, que são os domicílios rústicos, improvisados”, disse.
Para a Comissão de Athis do CAU/RJ, a inclusão de melhorias habitacionais e de uma linha de financiamento específica para reabilitação de imóveis ociosos nas áreas centrais, que alguns estão chamando de Minha Casa Minha Vida Retrofit representa um importante avanço para o programa e contribui para que ele possa ser, de fato, uma oolítica habitacional completa.
“No caso do Estado do Rio de Janeiro e, principalmente da capital, essas duas formas tocam sensivelmente nossa realidade. As práticas da política habitacional em nosso Estado já vêm há tempos agindo nas frentes de melhorias habitacionais e de reabilitação de imóveis ociosos. É o caso da Ocupação Manoel Congo, que a partir do próprio MCMV Entidades realizou a reconversão de um imóvel ocioso para 42 moradias no centro do Rio de Janeiro. E também da experiência do Arquiteto de Família em melhorias habitacionais no Morro Vital Brazil, em Niterói. Temos de olhar para as experiências locais e tirar lições delas para avançar. Por outro lado, é importante atentar para a integralidade das políticas habitacionais a partir dessas novas formas. Elas não podem resultar apenas em melhorias cosméticas e tampouco deixar de enfrentar a truncada questão da compra ou desapropriação desses imóveis ociosos, correndo o risco que todo o programa tem de não se traduzir em moradias de fato para a parcela da população que mais precisa dela”, afirma a Comissão.
MAIS ARQUITETOS(AS)
Nadia Somekh destacou que, desde 2015, o CAU Brasil destina 2% do seu orçamento para ações de ATHIS. Os investimentos já bateram R$ 23 milhões, por meio de editais de fomento. “É pouco, precisamos ganhar escala com esse trabalho”, disse. O CAU Brasil e o IPEA estão desenvolvendo uma proposta para um Fundo Nacional de ATHIS, com recursos de vários entes públicos. “O CAU pode ajudar pagando os arquitetos. Juntos podemos melhorar as moradias do Brasil”.
O CAU Brasil sugere a melhoria das habitações de forma complementar ao MCMV, a vinculação da habitação às prioridades do SUS, a inserção do aluguel social e a realização de Parcerias Público-Privadas (PPP) para ocupar as edificações abandonadas nas regiões centrais das grandes cidades. Ela ressaltou que esse trabalho deve levar em consideração os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), principalmente nas questões de mudanças climáticas e da saúde. “Isso deve ser entendido como um problema: as condições de habitação têm forte impacto na saúde da população. Se estamos pensando em melhorias na saúde, temos que pensar em melhorias na moradia”, afirmou.
Ela lembrou que mais de 4 milhões de pessoas vivem em áreas de risco, muitas delas com risco de morte. “As tragédias que a gente vem vivendo nos mostram que as mudanças climáticas precisam ser incorporadas às nossas políticas”.
PROJETOS EM PREFEITURAS
A arquiteta e urbanista Fátima Daudt, vice-presidente de Habitação da Frente Nacional de Prefeitos (FNM), afirmou que o programa deve contar com uma melhor fiscalização dos métodos construtivos. “Nossos cidadãos precisam de moradias dignas, não só por cinco anos, mas para a vida toda”, disse. Defendeu que os condomínios se sustentem com aluguel de espaço para comércio e a utilização de prédios ociosos para habitação, principalmente em áreas que já são urbanizadas.
Karla França, analista técnica em Planejamento Territorial e Habitação, da Confederação Nacional de Municípios (CNM), pediu mais diálogo com as Prefeituras. “Nos últimos 10 anos, grande parte dos municípios do país não conseguiu viabilizar a contratação de programas habitacionais com verba federal”, afirmou.
Ela propôs medidas específicas voltadas aos 4,9 mil municípios com população abaixo de 50 mil habitantes, que tem maior dificuldade financeira em participar do MCMV. Presente à audiência pública, o secretário nacional de Habitação do Ministério das Cidades, Hailton Madureira, informou que o governo está desenhando um programa para atender essas cidades, que deve usar convênios para financiar a construção de moradias.
MERCADO IMOBILIÁRIO
Hélio Alexandre, vice-presidente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário do Amazonas, defendeu uma maior participação dos municípios na administração dos empreendimentos entregues às famílias. “Precisamos pulverizar a administração. Nos retrofits de Centros Históricos, precisamos de parcerias com as Câmaras de Lojistas”, disse.
Segundo Rodrigo Wermelinger, diretor-executivo de Habitação da Caixa Econômica Federal, uma das prioridades do banco é o posicionamento estratégico junto aos municípios. “É onde a vida acontece. A Caixa está muito empenhada nessa aproximação”, afirmou. Ele sugeriu que as cidades usassem mais o mecanismo de doação de uma área: ó isso já reduziria de 15% a 20% o valor da unidade ou cobriria todo o valor de entrada do financiamento.
O presidente da Comissão Mista da MP 1.162/2023, Eduardo Braga, defendeu o retrofit nos centros das metrópoles brasileiras. “Nos grandes centros urbanos, temos as áreas mais degradadas e o metro quadrado mais barato das cidades”, disse. “Se quando colocamos os conjuntos habitacionais a 40km de distância faltam os serviços públicos, no centro temos tudo isso à disposição.”
A Comissão Mista da MP do Minha Casa Minha Vida ainda realizará novas audiências públicas antes da publicação do relatório final. A MP detalha as prioridades do programa, as faixas de renda dos mutuários e o público prioritário dos subsídios associados, como famílias chefiadas por mulheres.