Primeira mulher eleita como Conselheira Federal pelo Rio de Janeiro, a arquiteta e urbanista Maíra Rocha falou, neste 8 de março, sobre os desafios paras as mulheres na profissão, o papel do CAU na promoção da equidade de gênero e da diversidade e da importância de valorizar o trabalho diário das arquitetas e urbanistas. Confira a entrevista:
Quais são os principais desafios para as mulheres na arquitetura e urbanismo?
Acho que os maiores desafios da carreira da mulher na Arquitetura e Urbanismo estão presentes também em outras profissões. São desafios da profissional mulher. Vimos claramente, durante a pandemia, que as mulheres foram as primeiras a abandonar as atividades remuneradas para assumir os cuidados dos filhos, da família e dos mais velhos. Essa sobrecarga de tarefas não remuneradas no cotidiano das mulheres torna a vida profissional um desafio. Há questões que precisam ainda ser enfrentadas, como o assédio das profissionais no ambiente de trabalho, a menor remuneração diante dos colegas profissionais homens e a invisibilização do trabalho dessas mulheres na equipe. Muitas vezes, elas não assumem posição de comando, de coordenação, por existir uma menor confiança no seu trabalho. Observamos equipes de mulheres lideradas que por homens, que assinam as RRTs.
Nas palestras do grupo Arquitetas Invisíveis, as integrantes costumam perguntar para a plateia se conseguem citar 5 arquitetas e urbanistas mulheres. Que arquitetas e urbanistas você citaria e por quê?
Acho que existe um certo fetiche nessa coisa do arquiteto e da arquiteta brilhante. Eu acho que falar sobre o trabalho da mulher na arquitetura também é questionar isso um pouco. Por que a gente tem que buscar grandes nomes? Por que uma grande arquiteta não é uma arquiteta que tem um bom trabalho, mas que também realiza outras coisas, que consegue ter tempo para fazer as coisas que gosta, desenvolver outras atividades?
Eu acho que existe uma coisa perversa nisso de “cite grandes nomes da arquitetura mundial que são mulheres” porque é sobre isso também que a gente fala quando fala da invisibilização. As mulheres não devem passar a ser aceitas só quando elas viram grandes nomes de referência. O trabalho da mulher é importante dentro da profissão. Acho que isso alimenta um pouco o que a gente está tentando desconstruir que é o trabalho exemplar, o trabalho formidável. A gente está falando sobre existir e atuar na profissão. A gente não está falando sobre “você precisa ser genial para ser lembrada”, “você precisa ser a melhor”, “você precisa ser a Zaha Hadid para que você ser citada”, “se você não for a Lina Bo Bardi, seu trabalho não vale nada”. Eu acho que é sobre desmistificar isso. O trabalho da arquiteta que não é reconhecida vale tanto quanto, tem tanta importância social quanto.
Qual o papel do Conselho de Arquitetura e Urbanismo na redução dessas desigualdades?
Eu acho essencial o trabalho do Conselho para diminuir a desigualdade de gênero e raça dentro da profissão. Nesse sentido, a pesquisa que foi feita no ano passado pela Comissão de Gênero do CAU/BR é muito importante porque ela registra em números, dados e gráficos informações que são do conhecimento das profissionais mulheres, mas nunca antes tinham sido apresentados com tantos detalhes. É muito importante a gente conhecer a realidade do mercado de trabalho porque isso é base para diversas políticas de diminuição das desigualdades. Eu acho que o Conselho pode ir além, acho que o Conselho pode pensar campanhas sobre a importância do trabalho das mulheres no campo e também a importância do olhar da mulher para o espaço urbano…
Outra coisa que acho superimportante é a conscientização de que as mulheres profissionais devem registrar sua trajetória em RRT e em Acervo Técnico porque, muitas vezes, as mulheres não fazem. Acabam participando de uma equipe e aí o coordenador acaba fazendo o registro dessas RRTs, em geral, homens, e o que acontece é que a produção das mulheres acaba sendo assinada por homens e elas ficam em posição desigual para concorrer a cargos que exigem, por exemplo, um Acervo Técnico.