A abertura da exposição Souto de Moura: Memórias, Projetos e Obras reuniu arquitetos e urbanistas, além de vários admiradores da cultura arquitetônica, no histórico edifício do Paço Imperial, no Centro do Rio de Janeiro, na quarta-feira, 22 de março.
O evento contou com a presença do diretor do departamento de patrimônio material e fiscalização do Iphan, Andrey Schlee; a presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Maria Elisa Baptista; o presidente do CAU/RJ, Pablo Benetti; a presidente do CAU Brasil, Nadia Somekh; e o embaixador de Portugal no Brasil, Luís Faro Ramos.
Na ocasião, Schlee destacou a felicidade de a abertura da mostra coincidir com a sequência de atos importantes da nova presidência do Instituto de Patrimônio, que passam a marcar uma postura institucional presente, aguerrida e mais comprometida com o país. “O primeiro deles, de grande importância e, considero, de reparação histórica, foi o simples ato de mudança de denominação de um bem tombado. Em 1938, o Iphan tombou, pela primeira vez, uma coleção etnográfica, que recebeu, na época, o nome Coleção de Magia Negra, mantendo esse nome de triste memória, uma vez que a coleção foi constituída por conjunto de peças ligadas ao candomblé que era apreendidas pela polícia, flagrante perseguição às religiões de matrizes africanas. Passados quase 80 anos, o Iphan faz essa reparação histórica e mudou ontem (dia 21 de março) o nome da coleção para Nosso Sagrado. O segundo ato, bastante marcante também, foi a anulação da licença da empresa Tamisa para minerar na Serra do Curral, em Belo Horizonte”, afirmou.
A presidente do IAB ressaltou a importância da exposição e que a iniciativa traz também ânimo, principalmente neste momento que o Instituto se dedica a identificação e ao registro do seu acervo e busca caminhos para preservação e divulgação dos acervos de importantes arquitetos e urbanistas brasileiros, articulando iniciativas e a elas se unindo. Maria Elisa falou ainda da dor de ver acervos importantes de profissionais nacionais expatriados. “Esperamos levar a cabo projetos que permitam termos juntos, em solo brasileiro, nossos acervos preservados, catalogados, acessíveis e expostos. Um trabalho que precisamos fazer em parceria e contamos contar com Portugal”, disse.
Apaixonado pela obra do arquiteto português, o presidente do CAU/RJ faltou sobre o senso de proporção único no trabalho de Eduardo Souto de Moura. “É um dos poucos que domina o senso de proporção, que é tão importante. Uma vez questionado sobre a relação da arquitetura e o sítio, Souto de Moura responde que essa relação pode ser integrada ou contra a natureza. Ou seja, pode ser tudo. Essa maneira de definir é muito interessante, pois como ele (Souto de Moura) disse: tudo que existe ou é natureza ou arquitetura”, destacou Benetti.
A presidente do CAU Brasil evidenciou a reverberação do Congresso Mundial de Arquitetos de 2021 (UIA2021RIO) até os dias de hoje, que se materialização com a exposição em cartaz no Paço Imperial. “A pandemia impediu que o Congresso, assim como a exposição, ocorresse em 2020. Contudo, do limão a gente faz uma limonada, e conseguimos realizar um congresso inovador e verdadeiramente democrático, que contou com a participação de mais de 88 mil arquitetos de forma inovadora, de 195 países. Fizemos uma mudança de paradigma de congresso internacional. E foi no congresso que a parceria com a embaixada portuguesa se iniciou. Fizemos o Fórum de Entidades na embaixada. Assinamos protocolo de mobilidade com a Ordem de Arquitetos de Portugal. É uma alegria dizer que, embora não tivéssemos a efusão carnavalesca, isso vem se reproduzindo e hoje temos ressonância desse Congresso. Algo que não aconteceu lá, mas acontece agora. Estamos celebrando o UIA2021RIO”, defendeu Nadia.
O embaixador de Portugal no Brasil iniciou sua fala destacando que há males que vem para o bem. “Se esta exposição tivesse ocorrido em 2020, não poderia pedir, e vou pedir, uma salva de palmas ao Brasil que está de volta. Este é um efeito positivo de termos adiado a exposição para 2023”, afirmou. Luís Ramos vê Souto de Moura como figura central para a arquitetura mundial e disse acreditar que o pensamento do arquiteto português gera indagações interessantes para Portugal, assim como para o Brasil. “Gostamos de saber que o CAU, junto com o IAB, vai promover série de debates sobre a obra de Souto de Moura, um deles com a presença do arquiteto Jorge Figueira. Espero que apreciem a exposição e o ciclo de debates que vai ocorrer em março, abril e maio”, destacou Ramos.
Encontro Memória
A abertura da exposição Souto de Moura: Memórias, Projetos e Obras foi seguida de debate na icônica Sala dos Archeiros, no Paço Imperial. A atividade buscou resgatar o contexto do Rio Capital Mundial da Arquitetura, fazendo breve leitura dos debates do Congresso Mundial de Arquitetura de 2021, que teve o arquiteto Souto de Moura como um dos palestrantes principais. Além de dialogar sobre a importância de acervos de arquitetura e do acervo do arquiteto português para fomentar o estudo e o desenvolvimento do campo a partir da disponibilização pública dos documentos de projetos e uma reflexão sobre a valorização da arquitetura como manifestação cultural.
O debate contou com as participações da presidente do Departamento Rio de Janeiro do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RJ), Marcela Abla; do arquiteto e professor da Universidade de Coimbra, Jorge Figueira; do presidente do Comitê Executivo do UIA2021RIO, Sérgio Magalhães, da presidente do IAB, Maria Elisa Baptista; e do coordenador da Comissão de Políticas Urbanas e Ambientais do CAU Brasil, Ricardo Mascarello.
Maria Elisa iniciou o debate. Para a arquiteta e urbanista, a realização da conversa sobre a obra de Souto de Mora no Paço Imperial foi algo oportuno. A presidente do IAB leu também trecho do que disse Rafael Moneo no guia feito para a exposição em Portugal. “Eduardo Souto de Moura constrói com a crença de que através de sua obra dá aos outros o melhor e mais correto dos mundos”. Segundo Maria Elisa, a obra do arquiteto português demonstra que os sábios estavam certos. “Há uma associação entre o bem e a verdade. O mundo em que o essencial prevalece sobre o supérfluo. Arquitetura pode servir de modelo para nossas vidas, que a primeira vista parece pedir apenas o ar que respiramos. O paço, o largo o não viaduto nos devolvem o ar, nos devolvem o céu. De costa para baía, o cenário é a cidade. Cenário vivo onde a vida vem acontecendo há séculos”, disse.
Para Sérgio Magalhães, Souto de Moura manifesta de modo claro um vínculo entre a arquitetura dos arquitetos contemporâneos de maior expressão e a arquitetura vernacular portuguesa. Ainda segundo Magalhães, não é à toa que Portugal tem dois profissionais que receberam o Pritzker, o Oscar da arquitetura mundial. “Souto de Moura se destaca não pela manifestação espetaculosa da arquitetura produzida. Ao contrário. Foi a manifestação da arquitetura em respeito às preexistências culturais e, a partir dela, constituindo novas relações espaciais, que dão a expressão de uma arquitetura contemporânea como todos desejamos”, explicou.
Jorge Figueira apresentou retrato de algumas das principais obras de Souto de Moura e buscou, através do seu ponto de vista, ajudar os presentes na abertura da exposição a compreender melhor a figura de Souto de Moura.
Assista, abaixo, a íntegra da abertura da exposição Souto de Moura: Memórias, Projetos e Obras e o debate Memória
Souto de Moura: Memórias, Projetos e Obras
Prêmio Pritzker de Arquitetura de 2011 e Leão de Ouro na Bienal de Veneza de 2018, o arquiteto português Eduardo Souto de Moura terá sua obra revisitada na exposição “Souto Moura – Memória, Projetos, Obras” – no Paço Imperial, a partir de 22 de março.
Souto de Moura foi responsável por algumas das principais obras arquitetônicas de Portugal, como a “Casa das Histórias” – museu Paula Rego – em Cascais, o Mercado Municipal e o Estádio Municipal de Braga (Estádio Axa) – esse, referência para o prêmio Pritzker; a Casa das Artes, a Casa do Cinema de Manoel de Oliveira e o Edifício Burgo, no Porto; a Ponte dell’Accademia, em Veneza (Itália). Dignas de nota são também as intervenções patrimoniais no Convento de Santa Maria do Bouro, em Amares, no edifício da Alfândega Nova (atual Museu dos Transportes e Comunicações/Centro de Congressos e Exposições) e na antiga Cadeia da Relação (convertida no Centro Português de Fotografia), no Porto.
A curadoria de Nuno Graça Moura e Carlos Castro no Paço Imperial selecionou nove imagens de sete projetos de Souto de Moura, expostos em quadros que circundam a sala. No meio, em vitrines de vidro, estão croquis, fac símiles, anotações pessoais, fotografias de maquetes e outros documentos sobre cada umas das obras, que formam um conjunto de elementos de trabalhos relevantes para a compreensão da obra e do método de Souto de Moura nos seus diversos aspectos.
A convite do Instituto Camões em Brasília, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU) promoverá uma programação paralela para amplificar o debate sobre a obra de Souto Maior e a importância da preservação de acervos arquitetônicos. Participam desta programação o CAU do Rio de Janeiro, o IAB – nacional e o departamento do Rio de Janeiro – e o IPHAN. Serão três debates, o primeiro no dia da abertura (22 de março), terá como tema a “Memória”.
Numa época em que, como noutras, uma parte da arquitetura parece ter pedido algo do seu sentido essencial, acreditamos que esta mostra constitui uma oportunidade maior para sublinhar a relevância da obra de Souto de Moura.
A apresentação da exposição “Souto de Moura – Memória, Projetos, Obras” é uma iniciativa da Embaixada de Portugal no Brasil e do Instituto Camões em Brasília, em parceria com a casa de Arquitectura – Centro Português de Arquitectura . A realização foi possível graças ao patrocínio da Petrogal Brasil.
A exposição do Paço Imperial é uma versão adaptada da grande mostra do arquiteto realizada na casa de Arquitectura – Centro Português de Arquitectura – na cidade de Matosinhos, instituição para a qual Souto de Moura doou todo seu acervo, composto por 700 maquetes de 700 projetos.
Para Nuno Sampaio, diretor da Casa, o conjunto das obras expostas no Paço Imperial mostra mais de 40 anos do trabalho de Souto de Moura e reforça a ligação sentimental com o Brasil. “Trazemos a arquitetura do Brasil a Portugal – em maio, abrem duas exposições dedicadas a Paulo Mendes da Rocha – , levamos também nossa arquitetura ao Brasil. Os projetos expostos no Paço Imperial são uma visão da produção arquitetônica de Souto de Moura”.
Eduardo Souto de Moura nasceu no Porto em 1952. Licenciou-se em arquitetura pela Escola Superior de Belas Artes do Porto em 1980, quando também começou sua atividade como profissional liberal. Foi professor convidado em Paris-Belleville, Harvard, Dublin, Zurich, Lausanne e Mantova. Além do Pritzker em 2011 agraciado, segundo o júri, pela capacidade do arquiteto de conciliar características opostas, como o poder e a modéstia, a coragem e a subtileza, com destaque para os projetos do Estádio Municipal Braga, mais conhecido como o estádio AXA, construído numa antiga pedreira, e do Leão de Ouro em 2018, pelo trabalho no complexo turístico de São Lourenço do Barrocal, em Reguengos de Monsaraz, recebeu o Prêmio Wolf em 2013 e o Piranesi em 2017.