“O mercado hoje é mundial, e sou contra qualquer reserva. Acredito na troca universal de conhecimento, informações e tecnologias, bem como nas soluções criativas aplicadas em diversas sociedades, culturas e lugares. Porém, acredito na necessidade de que quem queira trabalhar aqui, tenha que se adequar à nossa legislação”, afirma o arquiteto e urbanista Ruy Rezende sobre a presença de escritórios e empresas de projetos estrangeiras no mercado brasileiro.
1- Nestes últimos 20 anos quais as transformações sofridas pela categoria?
Acredito que seja o posicionamento da profissão do arquiteto, que deixou de ser visto, na sua maioria, apenas como um artista impetuoso para ser visto como um profissional que agrega conhecimento e técnica, por um pensamento holístico, onde a plástica complementa a beleza da obra. Nosso CAU é parte deste momento.
2- Neste mesmo período, em função dos avanços tecnológicos em particular a informática, quais as mudanças mais expressivas ocorridas no exercício da profissão?
Os avanços tecnológicos oferecem maior liberdade de pensamento, quer seja nas técnicas construtivas ou na maneira de projetar. A informática, hoje presente de maneira constante em nossa sociedade, permite maior liberdade para pensar e tentar soluções. Hoje, podemos, por exemplo, de maneira integrada aos softwares de projeto, estudar da insolação e as ações mitigadoras desejadas ao estudo de formas plásticas complexas pretendidas. A compatibilização entre os projetos, essencial à arquitetura, que por definição da palavra em sua raiz grega, é o que vem antes da construção, se torna mais ágil e segura.
Na medida em que é atingido o objetivo, o produto é essencialmente virtual. Ou seja, o tempo para se obter a representação gráfica do projeto deixou de ser relevante, podendo ser gerado em qualquer lugar e por diversas mídias.
3- Como resultado das perguntas anteriores, como você avalia os novos rumos da profissão em relação ao exercício e também ao produto arquitetônico?
São diversos os fatores e suas temporalidades. Um projeto no seu melhor estado da arte pode ter seu contraponto em legislações urbanísticas ultrapassadas ou engessadas. Da mesma maneira que razões econômicas de um determinado momento possam ser agentes limitadores. Porém, a criatividade, essencial em nossa profissão, sempre dará conta ou minimizará estes conflitos que são a vida.
4- Na sua opinião, como deve ser a posição de nossas entidades em relação a presença de escritórios e empresas de projetos estrangeiras no mercado de trabalho brasileiro?
O mercado hoje é mundial, e sou contra qualquer reserva. Acredito na troca universal de conhecimento, informações e tecnologias, bem como nas soluções criativas aplicadas em diversas sociedades, culturas e lugares.
Porém, acredito na necessidade de que quem queira trabalhar aqui, tenha que se adequar à nossa legislação. Falando de arquitetos renomados mundialmente e olhando os diferentes, poderíamos ter por medidas simples a legalização da sua atuação profissional, hoje tácita. Porém, acredito na sua maior parte, informal. As empresas estrangeiras, que aqui buscam oportunidades, as vejo, também em sua maior parte, buscando seu posicionamento formal. Sinto valor agregado nesta vinda, da troca de conhecimento a maneira de trabalhar.
5- Com a saída dos arquitetos e urbanistas do sistema CREA/CONFEA e a criação do CAU – lei Nº 12.378 – deverá se dar a divisão de atuação das demais entidades dos arquitetos?
É um tema interessante e complexo. Cada caso é um caso e o bom senso fará que assim sejam olhados, diagnosticados, estudados e resolvidos.
6- Como deverá ser equacionado o sombreamento da atuação profissional entre o arquiteto e o engenheiro civil, já que agora estão filiados em Conselhos próprios?
Penso que a melhor atribuição das funções pode acabar sendo mais restritivas para ambas as profissões, mas irá eliminar as zonas de sombra ou superposição. O importante é a divisão que soma, ou seja, a delimitação das áreas de atuação, que irão melhor a performance destas atividades.
7- Para efetiva aplicação das atribuições profissionais definidas pela Lei Nº 12.378, quais deverão ser as modificações no ensino de Arquitetura de modo adequá-lo ao que estabelece a lei?
Penso que a revisão das ementas adequadas à legislação e a temporalidade são necessárias. Confio no sucesso da comissão do CAU que tem este objetivo.
8- Qual a sua opinião sobre a Política Habitacional e Urbana(s) desenvolvida(s) hoje no país?
O tema é amplo para que seja corretamente abordado aqui. Vejo principalmente o desejo de mudanças nestas políticas, o que por si só, é um bom indicador.
9- Como você classifica a qualidade da produção arquitetônica e urbanística em nossas cidades e até onde vai a responsabilidade dos arquitetos nestes projetos e obras?
Tivemos um longo período perdido entre as limitações de uma economia fraca e os engessamentos por legislações urbanísticas pobres de alma e conceito – reforçadas por um fraco posicionamento profissional. Nossa responsabilidade hoje, em um novo momento da nossa sociedade, é na busca e auxílio aos nossos parceiros, quer sejam públicos ou privados, nas posições que podem assumir que visem a construção de um mundo mais justo, socialmente responsável, tecnicamente ajustado a este ciclo e que permita por esta simplicidade, como já disse aqui, por nossa criatividade a beleza por um todo.
10- Quais deveriam ser as medidas concretas e objetivas de alteração da Lei Nº 8666 para que seja garantido o Concurso Público de Projetos como forma usual de licitação e contratação?
Bem, novamente o tema é amplo. Mas defendo de maneira simples que as licitações e ou concursos públicos estejam baseados em três pontos, a meu ver, essenciais. O primeiro: que o objeto do concurso seja definidor de uma pré-qualificação que envolva capacitação técnica e econômica. O segundo: que os preços ofertados sejam balizados pelas entidades de classe, ou seja, o menor preço é o da tabela. Existem mecanismos, como por exemplo, a engenharia de valor aplicada ao projeto que permite preços de obras menores com maiores ganhos a todos – contratantes e contratados. Hoje, prática comum no mercado. E, por último: agilidade nos processos e, inequivocamente, o poder do cliente final em determinar, se isto atende a seus objetivos ou não.
É claro que, como antecipei, as medidas que tragam novos ares a esta metodologia de intenção de contratação não se restringem a estas; o tema é vasto e com muitos meandros. Mas já seria um bom começo.