Com menos de 30% da visão, Fernanda Shcolnik é uma das 6,5 milhões de pessoas com deficiência visual no Brasil. Doutora em Literatura Comparada pela UERJ, Shcolnik sabe, na prática, como o urbanismo interfere no dia a dia da pessoa com deficiência. “Para as pessoas com deficiência visual, o piso é muito importante. É preciso pensar no material e na largura das calçadas. A bengala trava muitas vezes nas pedras portuguesas. Acessibilidade proporciona autonomia e segurança. Tem a ver com nosso direito de ir e vir”, afirmou no segundo dia de discussões do VII Encontro com a Sociedade do CAU/RJ. Evento ocorreu na quarta-feira, 5 de dezembro, no auditório do centro comercial em que o Conselho está instalado.
A mesa-redonda dedicada à temática da acessibilidade contou com as participações da coordenadora da Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Deficiência de Funcionários do Banco do Brasil (Apabb) Nives Porto; do militante dos direitos das pessoas com deficiência Ednilson Sacramento e do representante do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Petrópolis Luiz Felipe Cruz da Silva, além de Shcolnik, que faz parte também do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Rio de Janeiro. A mediação foi da coordenadora da Comissão de Acessibilidade do Conselho, Regina Cohen.
Obstáculos aéreos, como orelhões; a mudança de posição dos validadores dos bilhetes de ônibus; elevadores que não “falam” os andares foram outras barreiras citadas que parecem simples, mas que interferem na circulação cotidiana dos que possuem baixa visão. Ednilson Sacramento, que é cego, apontou ainda as “barreiras atitudinais da sociedade” como um dos obstáculos às pessoas com deficiência. Nesse contexto, Nives Porto, que tem um filho autista, disse que muitos atribuem alguns comportamentos de autistas à falta de educação, já que o autismo não é uma deficiência aparente. Outros aspectos pontuados por Ednilson foram: meios de transporte, assistência à saúde e a falta de acessibilidade das edificações. “O Conselho está no caminho certo quando abre espaço para a sociedade. Ao ouvirmos esses depoimentos, os arquitetos e urbanistas podem projetar melhor”, disse Sacramento.
Para a coordenadora da Comissão de Acessibilidade do CAU/RJ, já existem leis e normas que ajudam os arquitetos e urbanistas a projetar. “Mudar a cultura não pode mais ser um desafio de longo prazo”, defendeu.
Mobilidade urbana e gestão metropolitana foram foco de debate mediado pela Casa Fluminense
De acordo com o coordenador de informação da Casa Fluminense, Vitor Mihessen, 12 milhões pessoas, de um universo de 17 milhões, vivem na Região Metropolitana do Rio. “Em nenhum estado brasileiro é assim. Essa aglomeração impõe dinâmicas muito específicas”, afirmou. O estudo apresentado pela mestranda em Desenvolvimento Territorial e Políticas Públicas pela UFRRJ Natália Oliveira sobre Japeri foi um exemplo. A cidade é uma das mais pobres do estado e a que os moradores mais perdem tempo no deslocamento casa e trabalho.
Miguel Christino, do Observatório Social do Rio, lembrou que 70% do transporte público no Rio de Janeiro é feito por ônibus. “A obrigação de acompanhar as concessões às empresas de ônibus é do município, mas isso não tem acontecido. Queremos trazer a população para o papel de controle social”, disse. Segundo Christiano, a PUC realizou, em 2017, pesquisa com mil pessoas sobre o sistema de ônibus. O estudo seguiu metodologia usada na universidade de Harvard para avaliar a confiabilidade, segurança, integração e acesso aos transportes. As notas variam de -100 a 100. Na pesquisa, os ônibus do Rio ficaram com -76.
“A concorrência dos transportes públicos acaba sendo o transporte individual. O usuário prefere enfrentar o trânsito com o conforto do seu carro particular. Falta de conforto, custo elevado e problemas de integração dos transportes estão entre os principais motivos que levam as pessoas a largar o sistema público”, explicou Christiano.
Apesar das dificuldades existentes na mobilidade metropolitana, a bióloga Juliana de Castro vê no ciclismo uma oportunidade de incentivar uma modalidade de transporte ambientalmente mais sustentável, com estímulo à geração de emprego e renda. “A Lei Federal nº 11.771/2008, que dispõe sobre a Política Nacional de Turismo, estimula o turismo sustentável, com participação social. Vários países da Europa têm investido no cicloturismo. No Brasil, a tendência começa a crescer com o desenvolvimento de rotas e de toda uma cadeia produtiva baseada no complexo econômico da bicicleta”, defendeu.